Sites que produziram matéria fake news da repórter do Estado podem ser punidos

A repercussão de um texto contendo informações distorcidas sobre gravação de uma conversa de uma repórter do Estadão, Constança Rezende, a um suposto estudante estrangeiro, além do compartilhamento do conteúdo nas redes sociais, inclusive feito pelo presidente Jair Bolsonaro, pode implicar em penalizações tanto na esfera criminal quanto na esfera cível, segundo especialistas.
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O advogado Renato Opice Blum, presidente da Associação Brasileira de Proteção de Dados (ABPDados), explica que, no momento, ainda é difícil saber se é possível processar alguma das partes envolvidas. “Temos um caldeirão de informações truncadas, causadas pela dinâmica de velocidade da internet”, afirma.

PERCEPÇÃO – Para o advogado, a questão central que deve nortear as investigações sobre o caso seria se as pessoas envolvidas na divulgação do conteúdo, seja na publicação da gravação da conversa ou o compartilhamento nas redes sociais, tinham a capacidade de compreender que a informação era distorcida.

“Se as fontes primárias, que é o site francês no caso dos áudios e o site brasileiro no caso da tradução, fizeram de propósito para gerar uma informação irreal, pode ser responsabilizada. Depende de uma investigação para concluir o grau de dolo das fontes primária e secundária”, afirma Blum.

Na esfera criminal, onde os responsáveis podem ser enquadrados caso tenham tido intenções de distorção das informações, as acusações se concentram em crimes contra a honra: calúnia, injúria e/ou difamação.

PUNIÇÕES – A pena pode variar de um mês, no caso da injúria, até dois anos na pena máxima da calúnia, o crime mais grave entre os três. “O que vai majorar a pena na aplicação do juiz é a proporcionalidade que isso causou perante à sociedade”, explica a advogada especialista em direito digital Ana Paula Moraes.

Blum explica que calúnia é o ato de atribuir um crime a alguém, enquanto a difamação é a divulgação de algo que vai repercutir contra a honra da pessoa. Já a injúria atenta contra a honra pessoal de um indivíduo, não necessariamente implica em algo público. “Dependendo do caso, a acusação principal absorve as demais”, analisa.

Caso seja comprovado que as partes que compartilharam a notícia não tenham tido a intenção de difamar a jornalista, como perfis nas redes sociais, a acusação será necessariamente feita na esfera cível. “As publicações podem motivar ações por danos morais e a retirada do conteúdo da internet, mesmo em caráter provisório, caso a repórter ou o jornal decidam processar os autores”, avalia Moraes.

RELEMBRE O CASO – O site Terça Livre, que reúne ativistas conservadores e simpatizantes de Jair Bolsonaro, publicou na tarde deste domingo, dia 10, um texto que falsamente atribui à repórter do Estado Constança Rezende a declaração “a intenção é arruinar Flávio Bolsonaro e o governo”, baseada em uma conversa gravada, ao tratar da cobertura jornalística das movimentações suspeitas de Fabrício Queiroz, ex-motorista do senador e filho do presidente.

Constança, porém, não fala em “intenção” de arruinar o governo ou o presidente. A conversa, em inglês, tem frases truncadas e com pausas. Apenas trechos selecionados foram divulgados. Em determinado momento, a repórter avalia que “o caso pode comprometer” e “está arruinando Bolsonaro”, mas não relaciona seu trabalho a nenhuma intenção nesse sentido.

DISTORÇÕES – Entre os elementos no caso que podem configurar crimes, segundo Moraes, estão a distorção das falas, trechos com informações falsas, além da exposição da imagem e do áudio sem consentimento, com intenção de difamação. Em dado momento, o próprio presidente Jair Bolsonaro compartilhou em seu perfil no Twitter a matéria.

Blum avalia, entretanto, que a apuração profunda tem que ser feita junto ao site. “Juridicamente, ainda não sei se teria reflexos na assessoria de Bolsonaro”, diz.  

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – É inacreditável que ainda não tenha sido solicitada uma investigação pelo Estadão nem pela Presidência da República. A acusação é grave demais para ficar circulando, sem que haja comprovação. (C.N.)
Carla Bridi e Tulio Kruse/ Estadão

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